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NOTA DA DIREÇÃO DO SEPE – “BOLSONARO NUNCA MAIS”
5 de julho de 2022
Conjuntura Internacional:
A crise multidimensional
A crise geral do sistema capitalista, desenvolvida desde 2008, com suas contradições profundamente agudizadas pela crise climática, pela pandemia da Covid-19 que ceifou a vida de mais de 7 milhões de óbitos oficiais (esses números devem ser bem maiores se pensarmos nas dificuldades de controle sanitário nos países mais pobres em todo o planeta).
O mundo atravessa o que alguns especialistas têm chamado de uma crise multidimensional. A realidade trazida pela pandemia, como pela crise ambiental nos últimos anos foi reveladora da profunda crise vivenciada pelo sistema capitalista.
Os marcos gerais dessa crise podem ser expressos nas seguintes características:
– Existência de uma crise econômica e social no mundo, com redução das possibilidades do capitalismo de garantia de melhores condições de vida. Ao contrário, vemos mais desamparo, fome, miséria, arrocho salarial, desemprego, guerras e ondas migratórias.
– Divisão nas classes dominantes. Isso se expressa na extrema direita contra liberais; na competição entre EUA e China e na ausência de uma potência hegemônica.
– Crise de direção do movimento de massas e do programa comunista.
América Latina: “Às portas de um novo ciclo político”
O programa econômico de reformas e políticas neoliberais conhecido pelo nome de “Consenso de Washington”, se transformou no núcleo de sua retórica vitoriosa depois do fim da Guerra Fria. Um programa que combinava a defesa do livre-mercado com a desregulação financeira e a desestatização das economias que haviam seguido o programa desenvolvimentista coordenado pelo Estado. Isso aconteceu nas décadas de 80 e 90 do século passado, quando o neoliberalismo se tornou no pensamento hegemônico de quase todos os governos da América Latina, incluindo partidos socialistas e socialdemocratas.
Em 2013, 164 milhões de pessoas (27,9% da população) viviam em situação de pobreza na América Latina sendo que dessas 68 milhões (11,5% da população) se encontravam em situação de extrema pobreza e indigência. A desigualdade estrutural, desemprego, informalidade, superexploração, o não acesso aos direitos e políticas sociais, são a marca deixada pela políticas neoliberais implementadas pelos governos conservadores e de direita na região.
Na segunda década do século 21, os Estados Unidos radicalizaram ainda mais suas propostas globalitárias voltadas para sua periferia latina e mundial, agora já com viés golpista e autoritário, e sem nenhum tipo de horizonte social ou promessa de maior justiça e igualdade.
Quatro emblemáticos golpes de Estado foram substancialmente revertidos: Chile (1973), Peru (1992), Honduras (2009) e Bolívia (2019). Cada um foi impulsionado por forças políticas de extrema direita apoiadas pelos militares e pelo governo dos Estados Unidos.
Um novo ciclo de “esquerda” parece ter se iniciado na América Latina. Este ciclo foi suspenso pelo questionável impeachment da presidenta Dilma Roussef, do PT em 2016. Por um golpe político, midiático e institucional. E pela chegada ao poder de maiorias conservadoras e liberais na Argentina, Colômbia, Guatemala, Paraguai, Peru, El Salvador e Uruguai. Culminando com a eleição de Jair Bolsonaro em 2018.
A chegada ao poder presidencial do chileno Gabriel Boric, Xiomara Castro em Honduras, Luís Arce na Bolívia, Pedro Castillo no Peru e a recente vitória na Colômbia para a presidência de Gustavo Petro, se unem a uma série de presidentes que representam forças políticas de esquerda. Cada um deles lutou em campanhas eleitorais contra forças políticas fascistas com laços estreitos com os Estados Unidos. Mas antes dessas vitórias eleitorais, forças progressistas latino-americanas já haviam vencido as eleições no México e na Argentina.
Nesse novo contexto mundial, e latino americano, a viabilidade futura de uma alternativa latino-americana mais autônoma e soberana seguirá dependendo muitíssimo das escolhas feitas no Brasil. Ou seja, derrotar a extrema direita representada por Bolsonaro das eleições daqui a pouco mais de 100 dias. O país nesse momento ainda encontra-se tão ou mais dividido do que o resto do continente, entre duas grandes alternativas político-ideológicas e econômicas que transcendem a conjuntura política imediata e devem se manter polarizadas mesmo depois que o Brasil supere os estragos mais dramáticos produzidos pelo seu governo atual de extrema direita. O grande desafio é derrotar o bolsonarismo que segue uma tendência mundial de crescimento do neofascismo.
Brasil: derrotar Bolsonaro e a extrema direita nas ruas e nas urnas
O país vive o aumento da polarização política e de aprofundamento da crise econômica. O governo de Jair Bolsonaro possui ímpetos golpistas e um setor da extrema-direita com algum peso de massa, ao passo que se começa a abrir a possibilidade de vitória de seu principal concorrente Lula (PT), no primeiro turno.
O cenário é desolador: desemprego em 11%, aumento da informalização do trabalho, decomposição de renda, crescimento da inflação – chegando a absurdos 40% nos alimentos – desindustrialização, 33 milhões de brasileiros(as) passam fome e grande parte da população vive em insegurança alimentar. Uma pesquisa feita durante a pandemia mostra que 116,8 milhões de brasileiros não tinham acesso pleno e permanente a alimentos. Desses, 43,4 milhões (20,5% da população) não contavam com alimentos em quantidade suficiente (insegurança alimentar moderada ou grave) e 19,1 milhões estavam passando fome. O aumento de 31% de pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo, ao longo de dois anos de pandemia, é outro trágico indicativo da crise social.
Os negros e negras são cerca de 2/3 da população desempregada no país, com reflexo histórico das estruturas desiguais, herança do escravismo colonial que constituem o Brasil.
A execução de Bruno Pereira e Dom Philips em plena Amazônia coloca o governo Bolsonaro em uma crise diplomática sem precedentes, como desnuda as relações desse governo com o garimpo, com o desmatamento ilegal, com seu projeto de devastação da natureza e do meio ambiente e o genocídio dos povos indígenas.
Após a vitória de Bolsonaro, sua incapacidade de gestão dos negócios da burguesia e sua política golpista de governo, levaram a profundas divisões de parcelas dessa burguesia que lhe dava apoio. Já no primeiro ano de governo parte da grande mídia empresarial Globo, Folha de São Paulo, Estadão, representantes de importantes parcelas da burguesia brasileira romperem com seu governo e passaram para o campo da oposição.
Bolsonaro é resultado de uma situação que acaba convertendo uma parcela da política burguesa, porque trata-se de um político burguês que se organizou com setores burgueses com um projeto de extrema-direita. E esse projeto tem uma fração militar expressa em mais de 6 mil cargos de confiança que estão no governo.
Faz parte de um fenômeno mundial, a extrema direita existe no mundo todo, mas nem em todos os lugares está governando. Por isso, o Bolsonaro é muito exemplar, porque aqui a extrema direita está governando. Governa no Brasil, governa na Polônia, na Hungria. Tentou ganhar a eleição francesa e perdeu. Na metade do mandato de Bolsonaro, a derrota de Donald Trump nos Estados Unidos, foi um fator de desestabilização de seu governo.
Desde do #EleNão, Bolsonaro enfrenta ampla resistência da população, como pudemos ver em 2019 com o Tsunami da educação, em 2020 com os levantes antifascistas e antirracistas e ao longo de 2021, os atos pelo #ForaBolsonaro demonstraram com disposição da população em enfrentar os ímpetos golpistas de Bolsonaro e seu governo, de lutar contra as tentativas de fechamento do regime, e na busca de construir uma alternativa política para o Brasil.
Os ataques aos servidores e ao serviço público, os cortes orçamentários na educação, a ameaça à liberdade de cátedra com o Escola sem Partido, corrupção no MEC, as escolas militarizadas, são alguns dos ataques direcionados à educação. Eles também representam o oposto do projeto de educação pública, gratuita e de qualidade defendido, historicamente, pelo Sepe. Estamos em lados opostos da trincheira, e por isso é tarefa central organizar os educadores para lutar, resistir aos ataques e arrancar vitórias dos governos, garantindo nossos direitos e uma educação pública de qualidade para a classe trabalhadora.
Os quatro anos de governo Bolsonaro estão sendo desastrosos para a nossa classe. A escolha do governo por não estabelecer um programa de combate à pandemia aliada à grave crise econômica trouxe morte e miséria para milhares de brasileiros. A inflação segue alta, gerando fome e um exército de desempregados e trabalhadores informais no país. O desmatamento da Amazônia e a destruição das terras indígenas seguem a todo vapor, colocando em risco, inclusive, nossa sobrevivência. O discurso de ódio bolsonarista inflama parcela da população, aumentando cada dia mais os casos de feminicídio, lgbtfobia e o racismo.
A questão da tentativa de golpe pela extrema-direita no Brasil, se coloca, à medida que Bolsonaro se afunda com sua inépcia política e o resultado de seu péssimo governo aparece nas pesquisas eleitorais. A pesquisa eleitoral divulgada pelo Data Folha, foi um fato novo na conjuntura. Com Lula liderando com 48% contra 27% de Jair Bolsonaro. Está se abrindo a possibilidade, ainda por ser testada, que esteja colocada a vitória ainda no primeiro turno.
Nesse sentido, nós do SEPE acreditamos que é o momento de realizar uma ampla mobilização, massiva, com inclusive caráter de autodefesa da classe trabalhadora como uma tarefa prioritária a derrota de Bolsonaro em outubro, mas sem vender ilusões. O que se consagrará como um futuro governo Lula-Alckimin será um Brasil destroçado, em crise, com mais peso do setor empresarial e da burguesia, do que nos primeiros governos petistas. Nossa confiança deve repousar unicamente na força das mobilizações e nas lutas da classe trabalhadora e dos movimentos sociais. Será necessário mais do que uma eleição para derrotar o fenômeno de neofascismo bolsonarista no Brasil.
A onda conservadora que atingiu o Brasil em 2018, unificou vários setores da direita tradicional que apoiaram Bolsonaro. Foi o caso do BolsoDória que foi a expressão máxima dessa unidade. A eleição de Wilson Witzel, no Rio de Janeiro, um juiz obscuro, eleito no rastro da Lava Jato, de combate a corrupção e a criminalidade “ com o mote de tem que “mirar na cabecinha”, foi outra expressão do avanço da extrema-direita neofascista nos espaços da institucionalidade governamental.
Rio de Janeiro o berço do Bolsonarismo
Wilson Witzel acabou sofrendo impeachment. O que abriu espaço para chegada ao governo do Rio de Janeiro de também de outro político obscuro Cláudio Castro, que loteou o seu governo com os setores mais fisiológicos da política fluminense.
Castro é candidato a reeleição e lidera as pesquisas eleitorais. Que terá como candidato a vice o ex prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis, aliado de Sérgio Cabral e Bolsonaro. Político que foi condenado por crime ambiental em 2016, pelo STF, e se tornou inelegível. No entanto, o político mantém seus direitos políticos graças a um pedido de vista do ministro do STF, Kássio Nunes Marques (nomeado por Bolsonaro), ficando livre para concorrer ao governo do estado do rio de janeiro como candidato a vice governador.
Com o apoio de setores remanescentes do chaguismo, do cabralismo e do bolsonarismo, Cáudio Castro pretende manter o estado sob a égide de políticos ligados aos esquemas tenebrosos de corrupção, com uma polícia extremamente violenta e repressora, que faz da sua prática o extermínio de jovens negros e pobres das favelas e periferias, com uma forte relação orgânica de influência miliciana. O que coloca o Rio de Janeiro, berço político de Bolsonaro, o centro da extrema direita, o braço das milícias, que sequestra a população civil, que deve ser derrotado nas ruas e nas ruas.
Nesse sentido, é necessário organizar a mobilização social para deter os golpistas. Preparar comitês com a palavra de ordem “Bolsonaro Nunca Mais”, para enfrentar a deslegitimação das urnas, o desbaratamento das milícias, seguir as investigações dos responsáveis pela morte de Marielle Franco, a prisão de Daniel Silveira e cia e convocar o movimento de massas para discutir a auto-defesa, nesses próximos 90 dias.